domingo, 10 de julho de 2011
das estrelas, das lâmpadas, dos neons de bordeis e boates
é mais escura, então sou coberto pelo frio
e tateio dentro de mim buscando alguma coisa que me aqueça,
que ilumine a estrada tortuosa de cacos humanos em que caminho, descalço.
Há noites em que ando pela cidade, sozinho
vejo o meu reflexo estranho nas portas de vidro das lojas
meus olhos se encontram, minhas bocas permanecem mortas
e tão logo me vou
mas deixo a certeza de que não sou tão só quanto pareço.
Há noites em que viajo
e tranco na mala a realidade
subo no trem e sigo pela trilha do silêncio
despindo-me de vagão em vagão
amando de poltrona em poltrona cada amor que nunca amei
ouvindo as palavras que nunca ouvi
com as janelas fechadas para não ver a paisagem do mundo
mas elas se abrem e eu caio, fico para trás
então sei que estou no mesmo lugar, preso
na mala vida.
domingo, 19 de junho de 2011
Piedade, tempo.
para que não me leve todas as coisas
sei que ele beijará minha face, tateará o meu corpo
transformará em velhas e imprestáveis as coisas que carrego no bolso
as roupas que visto
quero que o tempo chegue depois da minha morte
para que eu possa apoiar minha cabeça cansada sobre o travesseiro daquela noite
quando te abracei pela primeira vez e cruzamos nossas mãos
quando o seu fogo espantou o frio que a noite soprava
e era a música que nos compassava o ritmo.
O tempo levou o ontem e me trouxe o hoje, sem você
e o amanhã, imprevisível, é um mistério
que o tempo se perca em si
e eu me encontre em você.
sábado, 18 de junho de 2011
farão falta amanhã, ou depois de amanhã, ou daqui a dez anos
quando eu encontrar alguém que me dê amor, que me faça gozar
e então caminharei eufórico e incrédulo por sobre os minutos apodrecidos
meus olhos ficarão loucos ao ver toda aquela podridão que me afeta
e ficarão ainda mais loucos quando verem a sua imagem nua de madrugada
fumando, ou me olhando em silêncio com um sorriso sem dente, ou dormindo.
Em outras noites, enquanto o sonho te iludirá
eu chorarei até que também seja iludido
porque terei consciência de que nossos minutos não são eternos
e que eles apodrecem e caem a toda hora
enquanto dormimos, trabalhamos, ou estamos distantes por alguma razão.
Um dia não poderemos mais andar
porque nossos pés não conseguirão pisar sobre o tempo que passou
a imundície dos minutos podres terão comprometido nossa saúde
e o último minuto cairá podre no chão empesteado por tantos outros
e perguntarei a mim e ao Deus que meu medo criará
quem se esgotará primeiro?
terça-feira, 24 de maio de 2011
sábado, 21 de maio de 2011
terça-feira, 10 de maio de 2011
sábado, 9 de abril de 2011
A paixão e a sua falsa certeza
de eternidade
a saliva alucinógena
dá aos olhos a visão do amor
e aos ouvidos, palavras gastas e ludibriosas
que a alma, drogada e fascinada
encarrega-se de enterrar em si
como o tesouro dos tesouros.
A tal paixão não sou imune
e nem quero ser
há por trás dos lábios
a nascente alucinógena
e palavras decoradas
que agora quero pra matar a lucidez
e esquecer baús desenterrados.
Negar a alma a ilusão da paixão
o faz de conta do eterno
é nunca contar a uma criança
qualquer história em noite medonha
viver sem amar
ou sequer pensar que foi amado
é deixar a hóstia se dissolver
sem nunca tocá-la na língua.
quarta-feira, 6 de abril de 2011
Quero me agarrar ao que se foi. Não quero apenas ver, quero reVIVER. Esse meu querer é irracional, mas é o que me resta: querer...
Ó lente... Tropeço no presente, caio, levanto-me e continuo trôpego, sem rumo. Sei que vou cair no grande buraco escuro lá na frente, no futuro. Talvez eu não levante. Se levantar, será para outras quedas. Há queda maior do que a do sonho no chão concreto, duro, inexorável da realidade? Deixem-me entrecego. Quero conservar até o último tombo o passado em meus olhos. Quero permanecer com as cortinas fechadas, escurecendo tudo, tendo pra mim aquelas imagens... Como num cinema eterno.
Queria te reencontrar, pedaço meu. Não, você não é nenhuma metáfora de paixão. Você realmente sou eu.
Estou desmoronando aos poucos, perdendo-me mais e mais.
Que ao menos alimente os abutres!
domingo, 3 de abril de 2011
sábado, 2 de abril de 2011
Amor deve ser invenção de poeta
ou delírio do meu peito
mas não escrevo pra discuti-lo
longe de mim
é que essa palavra de tão dita
tornou-se comum
gasta
mito!
Eu acho que o sinto
mas fica aqui dentro, guardado
apodrecendo.
Não me dão, nem pegam pra si.
Amor, se existe mesmo
também morre
se não existe
vou chorar em vão?
domingo, 27 de março de 2011
Dizem que a fé é que não deixa as pessoas que andam sobre a brasa queimarem os pés. E o que não faz nossos corações não virarem brasa na incandescência? Eles andam tão apressados... A fé é tão pouca que pode falhar na metade do caminho? A tão pouca coisa talvez explique a passagem rápida e quase devastadora da paixão. Mas que coisa?
sexta-feira, 25 de março de 2011
Eu descobri uma coisa. Talvez não seja descoberta, mas sim uma percepção. Se bem que, quando se passa a saber o que não se sabia, é, de certa forma, ou de forma literal, uma descoberta.
Como é que alguém pode saber que não sabia que não sabia? Quando se pergunta a uma criança, que ainda não aprendeu matemática, quanto é dois mais dois e ela responde que não sabe, pode ser que essa criança nunca tenha parado para pensar sobre aquilo. Aí ela passa a saber que não sabia. Mas há quem sabe que não sabe, mas não corre atrás de saber. Talvez isso seja muito pior do que não saber, pois, às vezes, o não saber não nos é consciente.
O quanto nós não sabemos por não saber? O quanto nós não sabemos por não querer?
Por que dizer que aquilo que eu não conheço ou nunca vi não existe? A senhora de cabelos ralos, óculos fundo de garrafa e manca, que tapava o sol com as mãos não existia. Mas ela existia! Bastou eu vê-la na rua para que passasse a existir.
Eu não existo, mas eu existo. Assim como as outras pessoas, assim como o mundo, assim como Deus.
Tanto a vida quanto o amor são uma descoberta. De repente sente-se, vive-se e você passa a saber disso. Engraçado é que se pode desaprender a viver e a amar. Cá para mim, desaprender a amar é muito pior, pois enquanto eu não sabia a vida, eu não vivia. E eu sei que quando, e se desaprender a amar, sentirei falta. Morto é de nada para nada. Desamar é de tudo para nada.
Muitos, ou todos nós, sem saber, tomam uma mentira como verdade. E depois, quando descobrimos, passamos a desprezar aquilo que tomávamos como verdade. As verdadeiras verdades podem ser tanto dolorosas quanto confortáveis.
O que eu descobri, agora percebo que já sabia, é que ao sentir a leveza da garrafa de café, tomando assim o último gole da madrugada, este tem o melhor, o mais sublime gosto. Uma pena é que os que tomam o último gole de café sem se dar conta disso, não conhece o sabor sublime.